sábado, 12 de março de 2011

Garrincha e Disney

Eu sempre achei que o Garrincha fosse um personagem de Walt Disney. Daqueles que ficam correndo nos bosques, entre árvores, rios, maçãs e flores. Com borboletas, cachorros, Mickey, Pato Donald e Pluto. Pra mim, o ponta direita mais famoso do Brasil sempre teve cara de coisa leve, que flutua e viaja com liberdade. É claro que não o vi jogar, nasci em 1976. Mas, Ruy Castro, Armando Nogueira e Nélson Rodrigues me contaram. E, sobretudo, meu saudoso avô me contou.

Vi também, quando criança, várias imagens em vídeo de Mané Garrincha e nunca consegui separar suas cores de desenho animado de um belo fundo musical. Eu tinha até um roteiro.

Vou explicar. Imagine Garrincha com a bola pela ponta direita. Três ou quatro marcadores perto dele. Capriche aí na cena, porque na sua imaginação não existem chuviscos de videotapes antigos. Mané, em traços mágicos, dribla um, dois, três, vinte e oito – vai lá, é a sua cena, pode tudo – volta, dribla de novo e chuta pra fazer o gol. Perfeito não é? Não. Porque falta o fundo musical. Garrincha driblando é como uma valsa de um desenho Disney. A música vai e volta como os zagueiros, a orquestra se alterna ao ritmo das pernas tortas do Mané, e os violinos vibram a cada João caído pelo gramado.

Volte e imagine toda a cena de novo, agora com a música. Os zagueiros Huguinho, Zezinho e Luizinho vão ficando para trás, o Professor Pardal tenta entender aquela invenção de dribles sem precedentes, e a orquestra lá, ritmando tudo. Ficou bem melhor.

O problema é que, como em todo conto de fadas, existe uma bruxa malvada, e ela apareceu para Garrincha. Com verruga no nariz e voz de megera, a bruxa do Mané era poderosa. Foi tomando conta da sua vida pouco a pouco, e, quando ele assustou, não era mais jogador, nem pai, nem amigo, nem marido, nem desenho, nem nada. Mané Garrincha provou a maçã envenenada da bruxa má e, para a orquestra de violinos de Walt Disney, só restou o silêncio.

Um comentário:

  1. Ótimo texto. Garrincha, uma estrela que nasceu, brilhou e apagou-se. Restaram as lembranças de momentos áureos e sombras ao final.Abraços.

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