quarta-feira, 20 de junho de 2012

Lágrimas de crocodilo

Quando um crocodilo devora uma presa, suas glândulas lacrimais são pressionadas de tal forma que ele chora enquanto se alimenta. Daí vem a expressão ‘lágrimas de crocodilo’, conhecida por todos e usada em vários idiomas, mundo afora.

O amor está sendo banalizado, em todos os cantos. Em qualquer lugar, as pessoas falam que se amam e trocam juras eternas, sem mal se conhecer direito. Nas redes sociais então... A palavra ‘amigo’ é mais uma que ficou comum. Basta um pequeno contato pro sujeito achar que já é o melhor amigo do outro.

As relações humanas estão ficando cada vez mais superficiais, e com isso, artificiais e falsas. Os rótulos e aparências ganham mais importância do que o verdadeiro conteúdo, e fingir acaba sendo mais funcional do que realmente agir.

No futebol não é diferente, já que o esporte reflete o que se passa na sociedade, principalmente o lado negativo. Hoje é difícil para um torcedor acreditar no que um jogador ou dirigente diz, já que a máxima na qual ‘não há verdade que dure 24 horas no futebol’ está se tornando mais e mais frequente.

Dirigente promete que não vai vender fulano e que nunca vai contratar ciclano. Jogador beija escudo e garante que jamais vai jogar no rival. Dirigente assegura gestão transparente, sem desvio de verbas. Jogador chora quando vai embora, jurando amor eterno ao clube.

Muita gente ainda acredita neles. Eu não. Não sei se estou cético ou desanimado com a banalização de todos os sentimentos, mas a mim não enganam mais.


terça-feira, 19 de junho de 2012

O ansioso

Pedir paciência para quem precisa dela na hora é a maior tortura que se pode fazer a uma pessoa. Em sã consciência, o impaciente sabe que deve manter os nervos sob controle para dominar a situação que enfrenta até que o esperado aconteça. Mas, na prática, isto é muito difícil, quase impossível. Um misto de ansiedade e agonia vai envolvendo o sujeito, de forma tão intensa, que paciência é a última coisa que ele vai ter.

Carlinhos tinha 11 anos e esta não é exatamente a idade em que o ser humano é um prodígio em paciência. Ainda mais quando falamos de um garoto fanático por futebol, bem na semana em que seu time vai decidir o Campeonato Brasileiro. Por algum motivo desconhecido e muito estranho, os pais de Carlinhos permitiram que ele fosse ao jogo, com os primos mais velhos, no Pacaembu, a poucos quarteirões de casa.

A ansiedade de ir pela primeira vez a um estádio de futebol, numa decisão de campeonato, com o clube de coração em campo, somou-se ao medo de alguma coisa dar errado, e a cabeça do menino virou um turbilhão. Dormir e comer se tornaram atividades raras para Carlinhos, que solenemente ignorava os protestos da mãe, contando cada segundo para o jogo no relógio.

Antes, porém, era necessário comprar os ingressos. Carlinhos pegou o dinheiro com o pai, com a promessa de repassar aos primos, já que a simples ideia de ter um garoto de 11 anos numa fila desta espécie era absurda. O menino, sem nenhuma paciência para esperar o contato dos primos, matou aula e foi para a fila do Pacaembu. Pelo menos 500 torcedores, brutamontes de todos os tipos, já estavam lá.

Algum gaiato soprou que as filas nos portões de trás do estádio estavam bem menores. O suficiente para que impacientes, com o intrépido Carlinhos entre eles, fossem morro acima, numa caminhada cansativa para constatar o óbvio. As bilheterias daquele setor estavam fechadas.

Desespero é a palavra exata para definir o que Carlinhos sentiu ao ver que a fila original estava com pelo menos o triplo do tamanho, e que sua antiga posição era excelente, a apenas alguns poucos metros do ponto de venda dos bilhetes.

Em pouco menos de 90 minutos, todos os ingressos já haviam sido vendidos, e Carlinhos, com todas as unhas das pequenas mãos totalmente roídas, mal tinha dado dois passos. Voltou pra casa tentando disfarçar o fracasso, já que havia mentido para os pais. E também para os primos. Quando se lembrou deles, teve certeza que seus problemas tinham solução, já que os parceiros poderiam ter algum ingresso sobrando.

Mas como ia saber sem contar a verdade? Não era possível. Carlinhos, então, inventou um colega de sala fictício e disse aos primos que o ingresso era pra ele. Nada feito. A entrada extra que tinham já estava reservada para um amigo que estava no nordeste e não iam cedê-la a um fedelho que não conheciam. Carlinhos ficou sabendo que os primos não enfrentaram nenhuma fila, já que tinham amigos na secretaria do clube, que entregaram os ingressos a eles longe do estádio, sem nenhum tipo de confusão.

A derrota era certa e pouca coisa poderia ser feita para evitá-la. Mas Carlinhos preferiu manter seu fracasso oculto para todos. Aos primos disse que tinha conseguido o ingresso com o pai de um amigo e aos pais nada falou, já que, para eles, tudo havia corrido dentro da mais perfeita normalidade.

No dia do jogo, Carlinhos se uniformizou, esperou os primos e saiu com eles em direção ao Pacaembu. Inventou mais uma mentira, disse que ia assistir à partida com os colegas de sala e, aproveitando-se do descaso dos primos, sumiu no meio da multidão.

Carlinhos tentou comprar ingressos de cambistas, mas não foi levado a sério por nenhum deles, e, então, achou uma pizzaria com TV, onde viu seu time ser campeão brasileiro, ouvindo o barulho que vinha do estádio. Depois do jogo, voltou para o meio da bagunça do Pacaembu, encontrou os primos no lugar marcado e chegou em casa contando histórias que só tinha visto pela telinha, sob olhares orgulhosos dos pais, que acreditavam ver o garotinho se tornando um homem naquele dia. O que não deixava de ser verdade, só que por outros motivos.

A moral da história é que todo ansioso faz burradas incríveis. E que, além de tudo, é orgulhoso e teimoso. Então, é bom aprender cedo, como Carlinhos, para evitar trapalhadas piores ao longo da vida.

domingo, 17 de junho de 2012

A primeira história de amor verdadeiro entre um boleiro e uma Maria Chuteira


Sandrinho sempre foi malandro, no bom sentido da palavra. Jogador de futebol profissional, rodou por vários países da Ásia e da Europa, até voltar ao Brasil e se firmar no time titular do Flamengo, ainda jovem, com 25 anos, e já estabilizado financeiramente. Criado na zona norte carioca, conhecia de cor e salteado todas as armadilhas que a profissão poderia lhe oferecer, mas, cabeça boa, nunca se envolveu com nada que o atrapalhasse ou tirasse seu foco. Ainda que não dispensasse um chopinho e um bom pagode, desde que a agenda permitisse e possível fosse.

Juliana sempre foi linda. Tinha plena consciência disto desde quando os primeiros traços de mulher despertaram na adolescência. Bronzeada em Ipanema, corpinho mignon cuidadosamente malhado, 22 aninhos de malícia, olhos verdes e pele dourada. Filha da classe média do Rio, inglês fluente, alto nível cultural, a loirinha sabia do seu potencial e já tinha definido tudo o que queria para a vida, em termos de luxo e prazer. Tornou-se modelo profissional e participava de alguns desfiles quando estava precisando de um dinheiro extra.

O jogador sabia aproveitar a vida. Quando não tinha compromissos pelo Flamengo, e longe dos olhos da imprensa, Sandrinho sempre descolava uma farra boa, com direito à mulherada de primeira qualidade e muitos parceiros do mundo da bola.

A modelo não era diferente. Tinha a lista de onde a boleirada costumava frequentar. Juju sabia como se vestir, o que falar e o momento exato de entrar no pagode, abalando geral e chamando a atenção.

Sandrinho e Juliana se conheceram em uma festa na cobertura de um zagueiro gaúcho do Fluminense, na Barra da Tijuca. Apresentados por um agente FIFA, que já tinha passado algumas noites com ela, os dois se deram bem de cara. O jogador achou a modelo linda, extrovertida e muito gostosa. A modelo gostou do que viu no jogador. Inteligente, bonitão e discreto.

Viveram uma tórrida noite de amor. A intimidade criada em duas horas de conversa na festa fez com que boleiro e Maria Chuteira se soltassem e se livrassem das máscaras que normalmente usariam nessas ocasiões. Os dois se separaram já com o dia claro, entre beijos apaixonados e promessas de novos encontros.

Sandrinho acordou naquela tarde com uma estranha sensação. Estava bem consigo mesmo, em paz, com uma vibração no peito que há muito não tinha. Pensava na modelo e não conseguia parar de sorrir.

Juliana ainda não tinha dormido. Lembrava-se do jogador com carinho e doçura. Sentia uma agonia estranha, que nunca tinha experimentado em toda a vida. Alguma coisa nele, que ela não sabia explicar, tinha despertado um desejo de ficar perto dele, de uma forma suave e silenciosa.

Sandrinho procurou o celular para ligar para Juliana. Não importava se ele tinha deixado a modelo em casa há menos de cinco horas. Nada importava. Só queria ouvir a voz dela. Dois recados do amigo, o agente FIFA que os apresentara na noite anterior, porém, fizeram com que o jogador mudasse de ideia. Os comentários maldosos do colega sobre a alta ‘rotatividade’ da modelo entre os boleiros frearam os impulsos de Sandrinho.

Juliana estava com o telefone na mão, neste mesmo momento. Enquanto procurava o nome de Sandrinho na agenda, para ligá-lo, foi surpreendida com o agente FIFA tocando o interfone de seu apartamento. A modelo ouviu pacientemente as piadas, nas quais ela era a nova vítima do terrível e inescrupuloso garanhão da Gávea. Esperou o agente sair e, se sentindo mal, decidiu ligar para Sandrinho um pouco mais tarde.

Sandrinho viajou com o Flamengo naquela semana e não telefonou para Juliana. A modelo preferiu esperar que o jogador ligasse e também não tentou entrar em contato com ele.

Juliana demorou tempos para esquecer o cheiro e a voz de Sandrinho. O jogador ainda se lembra do lugar exato da covinha no rosto da modelo quando ela sorri. Nunca mais se viram nem se falaram.

E foi assim então que a primeira história de amor verdadeiro entre um boleiro e uma Maria Chuteira não aconteceu.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Genivaldo e a lâmpada mágica

Parte I – O professor e o XV de Novembro

O glorioso XV de Novembro, da cidade de Quixeramobim, no sertão do Ceará, também é um desses times que tem um torcedor símbolo. O fanático pelo XV, que nunca passou da segunda divisão do campeonato estadual, é um professor de português do ensino médio que atende pelo nome de Genivaldo Lambari.

Cidadão pacato e de boa índole, Genivaldo é um sujeito caseiro, de hábitos comuns e vida modesta. Casado com Dona Margarida e pai de Cícero e Severino, de oito e quatro anos, o professor tem como único luxo, hobby e excentricidade, a paixão exagerada pelo XV, a Graúna do Sertão.

Como o XV nunca chegou à primeira divisão do Campeonato Cearense, o amor intenso de Genivaldo pelo clube era conhecido em toda a cidade. Em vários jogos pela segundona do estadual, o professor foi o único torcedor nas arquibancadas do velho estádio municipal. Sem patrocínios e nenhum tipo de apoio do poder público, o que todos esperavam é que o velho XV sumisse do mapa em pouco tempo. 


Parte II – A lâmpada


Até que Genivaldo, organizando jornais antigos com matérias sobre o time, na biblioteca de Quixeramobim, numa tarde de calor arretado, encontrou um objeto dourado parecido com uma velha lamparina. Imediatamente, o professor Lambari se lembrou dos livros que lia na infância, com histórias das mil e uma noites, odaliscas e gênios da lâmpada. Rindo de si mesmo, começou a acariciar o pitoresco objeto, como faziam os Aladins que ainda estavam vivos em sua memória de criança.

Genivaldo deixou a lamparina sobre uma prateleira de madeira e, enquanto saía para buscar um suco de umbu que refrescasse o extenuante calor, viu uma fumaça branca e espessa com o canto dos olhos. Pensando se tratar de um princípio de incêndio, voltou-se ligeiro para ver o que era, e qual foi a surpresa de Genivaldo ao ver um gênio azul de túnica branca e colete vermelho, flutuando a dois metros de si?

Homem tranquilo e ciente de seus atos, Genivaldo esfregou os olhos e teve certeza imediata de que se tratava de uma alucinação causada pela altíssima temperatura do sertão cearense naquele verão. Preferiu ignorar a espetacular imagem de um gênio flutuante e virou as costas, disposto a tomar seu suquinho de umbu. Foi quando ouviu uma voz calma e grave.

- Você é meu amo. Por ter me libertado de um sono milenar, eu lhe concedo três desejos.

‘Arre égua!’, pensou Genivaldo. Pálido e branco, como nunca na vida, voltou-se subitamente e encarou o gênio, olho no olho. A tranquila expressão do exótico árabe serviu para acalmar e diminuir os batimentos acelerados do coração do professor.

Se por um lado, Genivaldo era reservado e acanhado, por outro, também tinha seus sonhos e devaneios. Mesmo que aquilo fosse loucura ou alucinação, resolveu dar asas à imaginação, e pensou bem nas palavras (para não gastar um desejo de forma afoita, é claro) ao propor para o gênio:

- Você pode voltar pra dentro da lâmpada até eu chegar em casa e conversar com a patroa sobre os três desejos?

Preso há mais de mil anos na minúscula lamparina, o gênio custou a aceitar a proposta do professor. Só se convenceu e voltou para dentro quando Genivaldo jurou sobre uma bandeira do XV que o libertaria novamente em menos de uma hora. 


Parte III – O gênio


O gênio azul era um sujeito divertido. Com muitas histórias pra contar, logo de cara, criou laços de amizade com Genivaldo. O professor, que não era nada bobo, serviu um licor de jenipapo de primeiríssima qualidade para o gênio, que logo se soltou e se sentiu em casa.

Vindo de uma geração ultra-milenar de gênios da lâmpada, o árabe flutuante desfilou para o novo amigo um imenso rol de fascinantes histórias sobre seu passado, até o dia em que chegou ao sertão cearense e ficou esquecido dentro de uma caixa de velhos livros.

Dona Margarida só acreditou no que viu depois do terceiro desmaio. Com Cícero e Severino foi bem mais fácil. Os garotos não tiveram problemas para fazer contato com o gênio, e logo ficaram íntimos do convidado estrangeiro.

A relação entre o gênio da lâmpada e os Lambari estava fluindo da melhor maneira possível, até que o árabe lembrou Genivaldo dos três desejos, já que queria viajar mundo afora para curtir sua liberdade. 


Parte IV – Os desejos


Entrar em um acordo sobre o que pedir ao gênio não foi tarefa fácil para a família. Dona Margarida queria uma mansão, com direito a piscina, mordomo e três empregadas. Cícero só pensava num play station, enquanto Severino já estava decidido a pedir um hamster, igual ao que tinha visto na televisão semana passada.

Genivaldo, porém, foi egoísta e, enganando a mulher e os filhos, entregou para o gênio uma lista só com desejos seus.

1 – Que o XV de Quixeramobim seja o time mais rico do Ceará

2 – Que o XV de Quixeramobim jogue a Série A do Brasileirão este ano

3 – Que Messi seja jogador do XV de Quixeramobim

Dona Margarida, quando viu o que o marido tinha pedido, se revoltou, arrumou as malas e foi para a casa da mãe, levando Cícero, emburrado por não ter ganhado o videogame, e Severino, que não parava de perguntar:

- Cadê meu ratinho? Cadê meu ratinho? 


Parte V – O poderoso XV do Ceará


A repentina aparição do XV de Quixeramobim de Messi na elite do futebol brasileiro causou polêmica e foi alvo até de CPI do Senado. Mas, com uma manobra política, o recém-eleito presidente Genivaldo Lambari, conseguiu fazer com que tudo terminasse em pizza.

O XV estreou na Série A contra o Internacional, no Beira-Rio, e voltou pra casa com um humilhante 8 a 0 no lombo. Messi esteve em campo, mas como era o único reforço para um time semiprofissional, nada pôde fazer para evitar o vexame. Na rodada seguinte, o pior aconteceu. O craque argentino, ex-Barcelona, pisou num buraco do Estádio Municipal de Quixeramobim, numa partida contra o Bahia, e rompeu todos os ligamentos do organismo, ficando fora do time o resto da temporada.

Com 38 derrotas em 38 jogos, o XV foi rebaixado para a segundona e bateu todos os recordes negativos do futebol brasileiro. O dinheiro do clube foi todo gasto na pizza dos senadores e nos salários de Messi, que ganhou passe livre na justiça e voltou para a Espanha, no final do ano.

Falido, sem Messi e fora da primeira divisão, o XV de Novembro de Quixeramobim não teve alternativa diferente de fechar definitivamente o departamento de futebol profissional. 


Parte VI – Volta à rotina


A vida não poderia estar pior para Genivaldo Lambari naquele momento. Todos os projetos pessoais haviam fracassado e o seu amado XV sequer existia. O pior de tudo para o professor, entretanto, era a ausência da família, já que Dona Margarida e os meninos ainda viviam com sua sogra.

Genivaldo conseguiu de volta o antigo emprego na escola, juntou o que restava de suas economias, comprou uma piscininha de plástico, um play station de segunda mão, um hamster branco, vestiu uma roupa de mordomo e foi atrás de Dona Margarida e dos filhos.

Sensibilizada com o drama e o fracasso do marido, Dona Margarida voltou para casa e a vida dos Lambari seguiu como era antes de toda a confusão, tranquila e em plena harmonia. A única coisa que tirava a esposa do sério era o velho brilho que via nos olhos do marido quando um cartão postal de algum lugar distante chegava, enviado pelo gênio azul.

Genivaldo disfarçava a emoção e convencia Dona Margarida que o mais importante em sua vida agora era o bem-estar da família. Mas, para si mesmo, não dava pra mentir. Na verdade, da cabeça do professor não saía a imagem do Maracanã lotado em um imaginário jogo do outrora glorioso XV de Novembro de Quixeramobim.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Dia dos Namorados

Eu sempre vi o Dia dos Namorados como uma data comercial, assim como os dias das mães, dos pais e das crianças. Excelentes para o faturamento das lojas e toda a publicidade ao redor. Não costumo me envolver com o clima de romantismo que tentam nos mandar garganta abaixo, mas também não sou radicalmente contra a turma que entra de cabeça na ideia. Penso que qualquer fato que sirva para unir as pessoas, e trazer mais harmonia ao mundo, é válido, ainda mais com toda a confusão do nosso cotidiano. Ainda que, pra mim, seja artificial e passageira.

Não gostar do Dia dos Namorados não quer dizer que eu não goste de namorar. Muito pelo contrário. Acho que namorar é uma das coisas mais legais da vida, e muita gente deve concordar comigo. Ter uma companheira pra todas as horas, uma amiga pra dividir os segredos, uma amante pra fazer planos mirabolantes, enfim, ter uma namorada pra viver ao lado, é algo que deve ser valorizado e cuidado, com todo o carinho. Em todos os dias, e não apenas no 12 de junho.

Existem várias formas de namorar, que vão muito além da que tradicionalmente conhecemos, entre duas pessoas. Você pode namorar seus amigos, ao aproveitar um simples momento ao lado deles. Pode namorar sua família, ao perceber que a presença de Deus se manifesta verdadeiramente em cada contato com eles. Pode namorar seu trabalho, ao transformar o lugar de onde você tira seu sustento num ambiente de harmonia, tranquilidade e boa convivência. Pode namorar até seu time de futebol, desde que você saiba levar esta relação com equilíbrio e paixão na medida certa.

Mas, antes de tudo, e exatamente para que tudo dê certo, é importante namorar consigo mesmo. Porque, só assim, a vida vai fluir em paz. É preciso se respeitar, em primeiro lugar. Saber o seu próprio valor e o que você pode oferecer e merece receber. Valorizar suas qualidades e tentar minimizar seus defeitos. Porque quando seu romance com você mesmo estiver correndo às mil maravilhas, a tendência é que o mundo todo queira lhe namorar.

Namorar é ótimo. Poucas coisas na vida dão mais prazer. E, mesmo que eu ainda esteja considerando a data comercial, vou me permitir entrar no clima, para desejar a todos um feliz Dia dos Namorados. Mesmo pra você, que só namora consigo mesmo.



*Para Natália, que me faz querer ser melhor a cada dia

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Lembranças do tetra

Uma das imagens mais marcantes e lembradas da Copa do Mundo de 1994 é a do abraço entre Pelé e Galvão Bueno, na tribuna de imprensa do Rose Bowl, após o pênalti perdido por Roberto Baggio, que deu o título ao Brasil, sob o escaldante sol da Califórnia. É fácil fechar os olhos, ainda hoje, lembrar-se da cena, e ouvir o narrador da TV Globo gritando ao fundo:

- É tetra! É tetra! É tetra!

Não é de se estranhar que os dois respeitados cidadãos tenham perdido as estribeiras e saído de si no momento. Afinal, a seleção brasileira não ganhava uma Copa há 24 anos, quando um deles ainda era um jovem com planos ambiciosos, e o outro, o principal responsável por aquela conquista.

Narração igualmente emocionante foi a de Luciano do Valle. Na hora exata em que o italiano budista chutou o pênalti por cima das traves de Taffarel, o campineiro da Band começou a gritar:

- Brasil campeão do mundo! Brasil campeão do mundo!

Alguns não entenderam o porquê de Luciano não mencionar o tetra no momento da explosão do título. Mas eu lembro bem o motivo. Alguns dias antes, a seleção feminina de basquete havia conquistado o campeonato mundial, na Austrália, comandada por Paula e Hortência, e na transmissão, o narrador gritou a mesma frase.

Num programa depois do jogo, Luciano do Valle contou a história de um jornalista colombiano, que o perguntou sobre a emoção de falar o nome de seu país seguido da expressão ‘campeão do mundo’, algo que nunca havia sido feito na terra vizinha, em nenhum esporte coletivo. Luciano disse que o bordão tinha saído naturalmente e que esperava repeti-lo na Copa do Mundo de futebol, que se aproximava.

O Brasil faturou o tetra, Galvão abraçou Pelé, Luciano se lembrou do amigo da Colômbia, e o resto é história. Eu confesso que só prestei atenção no que os dois famosos narradores falaram ao rever o jogo, alguns dias depois, nos dois canais e várias vezes. No momento exato em que Baggio isolou a bola, eu também devo ter gritado alguma frase linda. Sem estar abraçado com um ídolo eterno e nem me lembrado de um colega estrangeiro. Mas, nem por isso, com menos emoção.