sábado, 26 de fevereiro de 2011

Figuraças

Quem ri do goleiro do Guarani do Paraguai, que tomou uma sacola de gols do Cruzeiro esta semana, e usa camisas com estampas de figuras como Bart Simpson, Batman, Chapolin Colorado e companhia, não se lembra do Chilavert e do Jorge Campos. Eram tão folclóricos quanto ele, só que bem melhores dentro de campo. Pobre Aurrecochea!

Quem acha graça do presidente do IAPE do Maranhão, que invadiu o campo no jogo contra o Atlético esta semana, com uma pança descomunal e jeito de andar de pinguim, não se lembra de Vicente Mateus e Iustrich. Invadiam o campo do mesmo jeito, só que com mais romantismo. Pobre Pereirinha!

Estas figuras folclóricas do futebol existem desde sempre. Ou, pelo menos, desde os meus tempos de menino. Eu me lembro de três artilheiros nordestinos, que toda semana, faziam a festa nos Gols do Fantástico. Todos com nomes engraçados e o bom hábito de fazer muitos gols. Jacozinho, Dadinho e Mirandinha. Juntos, jogaram por 126 clubes e fizeram mais de cinco mil gols. Pelo menos, nas minhas contas.

Tinham também os estrangeiros. Ou alguém vai falar que o Ruud Gullit não era uma figuraça? O Alexi Lalas, com aquela cara de baixista do ZZ Top? E o Djibril Cissé, que parecia a reencarnação do Predador?

Reparando bem, todos os jogadores folclóricos que são lembrados até hoje, o são também pelo que fizeram dentro de campo. Se neles há alguma coisa bizarra, como o nome ou a aparência, não deixaram por menos, e fizeram seus gols e suas boas jogadas ao longo da carreira. Prova de que não adianta apenas querer entrar para a história das grandes figuraças do futebol. Querer é fácil, mas tem que poder. Aurrecocheas e Pereirinhas da vida estão aí para comprovar.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Sabores

Esta semana revivi um dos grandes sabores perdidos na minha memória gustativa infantil. O bom e velho Guaraná Jesus, do Maranhão. Lembro que meu pai me trouxe uma garrafinha na infância, um amigo uma lata na adolescência, e foi só. Mas ainda assim, o sabor ficou vivo, e é impressionante o arrepio do corpo e do cérebro, ao tirar das gavetas filmes há muito arquivados, como o cheiro da antiga loção de barbear do velho, a cor das paredes da casa em que eu morava e o sotaque do amigo maranhense que não vejo há mais de 20 anos. Tudo isto, com um simples gole no líquido cor de rosa, que reencontrei em São Luís.
  
O mais fantástico é pensar que outros gostos espalhados mundo afora podem trazer lembranças semelhantes. O problema é lembrar quais são. Outro refrigerante, com sabor do primeiro time do bairro? Algum tempero perdido da macarronada da querida avó, que coloca na mesa da sala tios e primos que não estão mais por aqui? A empada da cantina do primário, que você comia ao lado do primeiro amor da sua vida, mesmo sem ter a mínima noção do que era isso? Hummmm... você só vai lembrar quando senti-los de volta, deliciosos e históricos, dentro da boca, se é que ainda é possível revivê-los.

O mesmo acontece com os cheiros. Quantas vezes, você lá, distraído, na rua ou no trabalho, e passa uma pessoa com um perfume que lembra alguém? Como parar aquele turbilhão feroz que traz de volta passagens, capítulos, talvez vidas, de histórias esquecidas?

Mas não faz mal. Bom é lembrar. Pobre de quem não traz na mente cheiros e gostos. Que recordem semana passada. Ou o mês que se foi. Melhor ainda se forem de épocas em que você nem consiga precisar direito. Mas que foram bem vividas, com toda sua paixão. E todos os sentidos.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Fidelidade

Quem ama não trai. Homem que é homem é fiel. Pode ter três esposas ao longo da vida, quatro namoradas ao mesmo tempo. Pode trocar de religião, xingar o padre, bater no pastor, agredir o rabino. Pode mudar de bairro. Pode escolher outra marca de cerveja e beber litros dela num boteco diferente. Só não pode trocar de time.

O cidadão que troca de time é mau caráter. Não tem respeito pela coisa mais marcante dos primórdios da sua infância. Trocar de time é como desonrar pai e mãe. É ofender ao próprio Deus todo-poderoso. Não se troca de time, em hipótese nenhuma, nem sob tortura. Nem que o velho esquadrão seja rebaixado para a Série D. Ou que perca de 7 x 0 pro maior rival. Você tem todo o direito de ter raiva do técnico, dos jogadores, do presidente, de quem quer que seja. Mas jamais pode trocar de time. A não ser que você seja um cafajeste, safado e sem moral.

Amar um clube é caminhar ao lado dele por toda a vida. Atravessando terremotos, tsunamis e chuvas de granizo. Lutando contra crises financeiras, dirigentes corruptos e derrotas vexaminosas. Quem não sofre nos períodos de tristeza, não tem o direito de comemorar os momentos de glória. Afinal, o torcedor fiel sabe disso: quem ama não trai.

O torcedor sincero

Crianças têm 30 milhões de defeitos. São barulhentas, teimosas, birrentas, melequentas e parecem ter a energia de dois exércitos em guerra. São manhosas, chiliquentas, irritantes, pirracentas, mas ninguém nesse mundo pode negar que são as criaturas mais sinceras do planeta.

É claro que existe um outro lado. Muito maior e mais intenso do que o das linhas acima. É como se fossem 40 milhões de qualidades. Crianças também são amorosas, criativas, ingênuas e curiosas. São puras, sagazes, doces e carinhosas. Mas, nada é mais forte do que a sinceridade que toda criança carrega dentro de si.

Tenho um amigo argentino. Veio para o Brasil no começo dos anos 1990 e nunca mais foi embora. Por causa do trabalho, foi ficando, ficando, ficando, até que ficou de vez. Casou-se com uma belo-horizontina e só vai em Buenos Aires para ver como anda a saúde da mamacita. Como quase todo hermano, é fanático por futebol. É torcedor do Racing e, quando teve seu primeiro filho, nada mais natural do que fazer o muchacho virar também um torcedor do time de Avellaneda.

Acontece que o pequeno Martín, tão brasileiro quanto você ou eu, nunca se simpatizou pelos 280 capítulos de história que o Racing do pai, Ramón, meu amigo, escreveu ao longo dos anos. Era mais do que natural, então, que o garoto torcesse mesmo para um time brasileiro.

Neste ponto é que a história fica boa. A mãe do Martín, Raquel, é atleticana desde duas gerações atrás. Avô, tios e pai conselheiros do Galo. Ela mesma nunca ligou muito pra futebol, mas, pra não contrariar os turcos, se diz a mais fanática das alvinegras. O Ramón, justamente pelo motivo contrário, que era irritar a turcaiada, inventou uma ligação afetiva entre o Cruzeiro e o zagueiro Perfumo, que jogou no Racing do seu coração e no Cruzeiro dos anos 1970, pra torcer pelo arquirrival da família da esposa.

O fato é que nem a Raquel nem o Ramón, com tantas outras coisas na cabeça, se preocuparam muito com o time de coração do pequeno Martín. Até que ele, logo nos primeiros anos de vida, se mostrou um verdadeiro fanático pelo velho ludopédio.

Martín foi atleticano e cruzeirense ao longo da infância, ora agradando aos tios, ora fazendo cara boa pro pai. Só que, nesta altura da vida, a família já morava num condomínio, no município de Nova Lima, cidade bem ao lado de BH e terra do tradicional Villa Nova.

O garoto, então, achou a solução para todos os seus problemas. Justificou pros tios e pro pai que tinha torcer prum clube da sua terra. Virou um fanático villanovense. Ganhou camisa do time, dada secretamente pela Raquel, e o Ramón, pra aumentar de vez a implicância dos cunhados e do sogro, leva o Martín em todo jogo do Villa. Ele sonha em jogar com a camisa 10 do Leão, num Mineirão lotado, contra Atlético ou Cruzeiro. Mas, se não der, vai se contentar apenas em ser presidente do Villa.

O Martín é manhoso, amoroso, irritante e puro de coração. E, dentro de toda sua sinceridade, é o mais fanático torcedor do Leão do Bonfim de Nova Lima!



Para Valter Lobato, pai de um garoto muito parecido com o Martín

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Medo

Criança tem medo de muita coisa na vida, tipo Bicho Papão, quarto escuro, mula sem cabeça, Tiranossauro Rex e outros monstros de arrepiar. Quando ela cresce um pouco e vira adolescente, os medos vão ficando mais concretos, como prova final, vestibular, separação dos pais, acidente de trânsito e coisas que são horripilantes mesmo.

Os medos são nossos amigos, na verdade. Fazem a gente se afastar do que pode nos machucar pra valer. E nos deixam numa faixa de conforto onde nada nem ninguém pode nos atingir.

Eu bem me lembro da minha infância e do que me assustava. Pra fugir de todos os fantasmas, imaginários e reais, eu ia jogar bola na rua. Ou então, torcia pra ser quarta ou domingo, pro meu pai ou meus tios me levarem pro Mineirão.

Na adolescência e na vida adulta as coisas não mudaram muito. Até hoje eu afogo os medos e problemas do dia-a-dia na pelada de segunda-feira, com os bons e velhos amigos. Ou quem foi que disse que cada homem crescido não tem seu Bicho Papão pessoal, cutucando terrível, que nem ferro de dentista, a cada descuido seu?

Mas o que me preocupa mesmo são as crianças de hoje. Como será que esses pobres meninos e meninas exorcizam seus medos? Jogar bola na rua é impossível. Carros velozes, sequestros, roubos, mil e uma formas de violência de todos os tipos...

Ir ao estádio, então, é ainda pior. Como levar uma criança ao campo com tanto arrastão, tanta pedra voando, tanta briga?

E assim, nossas crianças de hoje vão condensando seus medos em playstations, facebooks, i-Pods e solidão. Sem nenhuma válvula de escape. Pobres de nós...

Celso e Lucas

Celso Rezende é um cara tranquilo. Formado em educação física, é preparador físico e trabalha com o técnico Dorival Júnior há algum tempo. Já teve sob sua tutela atletas como Neymar, Paulo Henrique Ganso, Phillipe Coutinho, Guilherme, Marcelo Moreno e André, e hoje trabalha no Atlético, de Belo Horizonte, onde cuida de jogadores como Diego Tardelli, Magno Alves e o pentacampeão Ricardinho.

Lucas Silvestre é filho de Dorival Júnior. É outro cara tranquilo. E muito gente boa. Tem apenas 23 anos, mas já trabalha como auxiliar-técnico do pai. No Atlético. De Belo Horizonte. Lucas tem que matar um leão a cada dia pra mostrar sua competência e provar que tem talento pra viver no ingrato mundo do futebol, com suas próprias pernas, mesmo sendo filho de quem é.

No segundo semestre de 2007, portanto há apenas três anos e meio, Dorival Júnior era técnico do Cruzeiro. Da mesma Belo Horizonte. Rival do mesmo Atlético. Celso Rezende era preparador físico do clube e o Lucas, ainda na faculdade, acompanhava de longe, todos os passos do pai. Naquela época, o Cruzeiro venceu o Atlético duas vezes seguidas e os dois, Celso e Lucas, ficaram felizes da vida com os resultados.

Hoje os três, Dorival, Celso e Lucas, estavam no ônibus do Atlético que foi apedrejado por alguns marginais misturados na torcida do Cruzeiro, na chegada do estádio onde os dois times se enfrentariam. As notícias são boas. Os vidros se quebraram, mas ninguém saiu ferido. Alguns poucos estilhaços caíram no colo de Celso Rezende e Lucas Silvestre. Os mesmos que, pouco tempo atrás, estavam torcendo pro Cruzeiro vencer o Atlético, mas que hoje cometeram o gravíssimo crime de estar do outro lado. E por isso foram apedrejados!

Nunca vou entender isso. O cidadão sair de casa pra ver a coisa mais emocionante e divertida do mundo, que é o futebol, com a intenção de agredir, bater e até matar. Sorte grande que não aconteceu nada de mais grave com o Celso e o Lucas. Mas nem sempre é assim.

A gente tem que cuidar do nosso velho ludopédio, antes que acabem com ele.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Heróis e vilões

A vida é feita de heróis e vilões. Ou você é muito bom ou é muito mau. Ou salva lindas mocinhas ou sequestra velhinhas indefesas. Ou é benfeitor de uma instituição de caridade ou arranca máscaras de oxigênio de pacientes em estado terminal.

Pelo menos foi isso que me ensinaram quando eu tinha cinco anos. Não tinha meio termo. Era amor ou ódio. Super Homem e Lex Luthor. Batman e Coringa. Homem Aranha e Duende Verde.

Levei isso para as coisas que gostava e tudo se refletiu mais claramente no futebol, claro. Sou da geração que sofreu com a perda da Copa de 1982. Eram heróis - ainda que não necessariamente vitoriosos - Zico, Falcão, Sócrates, Éder e companhia, enquanto os malditos vilões eram basicamente Paolo Rossi e Dino Zoff.

Acontece que me contaram que o Dino Zoff era um cara extremamente bacana. E que o Paolo Rossi tinha comido o pão que o diabo amassou por causa de um escândalo na loteria italiana, no começo dos anos 1980. Então, automaticamente passei a admirar e gostar dos dois grandes vilões da minha infância.

Depois disso passei a enxergar com outros olhos todos aqueles que eram considerados malditos no futebol. O maior que vi foi o ponta-esquerda Ado, do Bangu. Ele perdeu o pênalti que deu o título do Campeonato Brasileiro de 1985 ao Coritiba, no jogo sem graça mais emocionante da história.

Na minha lembrança, todo mundo torcia pro time carioca, menos eu. Na hora em que o Ado perdeu o pênalti, eu achei bom. Mas bastou o Coxa ser campeão e a câmera dar um close nele, pra eu me lembrar que o Ado era tão humano quanto eu, que devia estar se contorcendo em dores e que jamais teria espaço na minha galeria de vilões. Ado virou herói a partir daquela hora. Porque, ao invés de comemorar com os coxa-brancas, tão distantes do eixo como nossos times mineiros, eu queria mesmo era consolar o pobre diabo que tinha acabado de entrar pra história.

Hoje o Ado vive anonimamente no Rio de Janeiro, tentando seguir na carreira de treinador. Sem sequer imaginar que é heroi de um garoto que cresceu torcendo pra que ele voltasse no tempo e acertasse aquele pênalti, ainda que fosse apenas nos seus sonhos.

E vem aí mais um clássico...

Maravilha! Sábado tem Cruzeiro e Atlético na Arena do Jacaré. Peraí... vamos começar o post de novo.

Maravilha! Domingo tem Cruzeiro e Atlético no Mineirão. Ops... o certo é o primeiro, né? Mas tem nada não. É temporário. Enquanto reformam o Mineirão, vamos vivendo nosso jogo principal em Sete Lagoas, Uberlândia, Ipatinga... não importa, a bola tem é que rolar, seja onde for.

Quando eu era moleque, a gente ficava tenso a semana inteira do clássico. O jogo podia valer pelas quartas de final do Brasileirão, como em 1986, ou pela repescagem da fase A do grupo 3 do segundo turno da chave amarela, como deve ter sido em algum ano em que não me lembro bem ou que acabei de inventar, tanto faz.

O certo é que, naquela semana, a garotada apostava lanche, combinava caravana pra ir junto ao Mineirão, ia pra escola com a camisa do time de coração e se dividia entre alvinegros e celestes até na fila da prova oral.

As coisas não mudaram muito, agora em 2011. O frisson do grande clássico de Minas continua o mesmo. Vejo o pessoal na redação agitado, as ruas de BH coloridas e o clima totalmente envolvido no jogo, ainda que ele seja disputado em outra cidade.

A moçada da minha turma segue do mesmo jeito. Ou quase. Hoje apostam cerveja, ao invés da merenda escolar. Os cruzeirenses vão se organizar pra ir juntos até Sete Lagoas, pois o mando de campo é do time azul, e só eles vão ter acesso ao estádio. Enquanto isso, os atleticanos vão combinar a casa de alguém, ou um bom bar, para ser a sede da torcida. Na próxima vez, eles é que vão encher a Arena. Coisas do futebol moderno...

Tem Cruzeiro e Atlético sábado! Maravilha... Tomara que a violência e todas as outras coisas ruins do futebol moderno fiquem fora do espetáculo. Porque no domingo a vida vai continuar e todos nós, cruzeirenses e atleticanos, vamos seguir lado a lado, o mesmo caminho do dia-a-dia. Futebol é o melhor jogo do mundo. Mas não passa disso.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

William Morais

A ideia de fazer este blog sempre esteve ligada a coisas boas. Memórias, histórias, piadas e brincadeiras, a maioria delas relacionadas ao futebol e ao que uma criança (no caso eu, 30 anos atrás) enxergava sobre o assunto.

Tudo o que escrevo aqui tenta ser bem parecido com o que sou. Bem-humorado, otimista e feliz da vida. Falo muito dos meus pais, irmãs e amigos porque ainda não sou casado e nem tenho filhos. Então, é essa a visão mais íntima que tenho da vida e das minhas brincadeiras ludopédicas.

Hoje, porém, não dá pra brincar nem sorrir. Acabo de receber a notícia de que um jogador de 19 anos de idade foi covardemente assassinado em Belo Horizonte. William Morais é o nome dele. Veio do Corinthians para o América em janeiro.

Dezenove anos! Imagino os sonhos que tinha esse moleque. Se eu, com 34, ainda penso em dar um chapéu no Messi e dominar o mundo, o que falar de um garoto cheio de saúde e talento?

Quantos sonhos de Mineirão lotado... Maracanã, Camp Nou, San Siro? Quantos Américas, Lyons, Valencias, Bayerns? Quantos gols, dribles, quantas convocações para a Seleção?

Fica um abraço para o pai, para a mãe e para os irmãos do William. E o desejo de que consigam entender os desígnios de Deus e encontrar forças para seguir em frente...

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Milonga del moro judio

Resgatando velhos arquivos no computador aposentado da casa dos meus pais, descobri o texto abaixo, escrito em 2006 e publicado num blog que não existe mais. Não tem nada a ver com o nosso Velho Ludopédio, mas, na iminência de mais uma guerra no mundo, resolvi publicar aqui. A diferença é que antes eu mandei só a letra da música. Agora vai só o vídeo.

Voltamos a qualquer momento com nossa programação normal.
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Eu sempre entendi as guerras. Explico-me: não concordo com elas, nem com os motivos - em 100% dos casos banais - mas entendo o porquê de um povo matar o outro. Explico-me de novo: entendo a visão deles, mas não concordo nem ratifico os motivos.

Aliás, achava que entendia. E nada como a arte pra te fazer abrir os olhos e mudar sua mesma velha opinião formada sobre tudo.

O cantor uruguaio Jorge Drexler tem uma música chamada "Milonga del moro judio" ou "Milonga do mouro judeu", que conta a história de um árabe judeu que vive entre cristãos e simplesmente não consegue odiar nenhum povo nem matar em nome de nenhum Deus, de nenhuma religião ou de um país qualquer. A canção está no disco "Eco", de 2004.

O tal mouro me fez pensar: afinal, se temos 98% de DNA em comum com os ratos, o que dizer do DNA de outro povo? Ele se torna distinto do nosso se é de outra religião, outra raça ou de outro país? E mesmo que se tornasse, isso seria motivo para ódio e guerra?

Já não mais entendo guerras sobre domínio territorial, diferenças religiosas e - principalmente essa - sobre petróleo. Já não entendo extermínio nem genocídio. Já não entendo os homens-bombas, os kamikazes nem as medalhas de condecoração. Nada mais sei sobre nada bélico, seja um míssil de longo alcance ou um bodoque.

Vale-me o consolo de que nunca é tarde pra mudar suas ignorantes ideias acerca das pessoas e do mundo. Ninguém é obrigado a ser eternamente estúpido...




terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Rivalidade

A rivalidade é uma das coisas mais gostosas do futebol. Em algumas ocasiões, comemorar uma derrota do seu principal adversário é tão bom quanto celebrar um triunfo do seu time. Ganhar deles então nem se fala! É motivo pra uma semana inteira de festa, com direito a gozações no trabalho, na escola e na pelada do bairro. E até mesmo nas festas de família. É só nestas horas que é bom ter um cunhado fã do arquirrival.

Um torcedor fanático não usa as cores do rival em nenhuma hipótese. Não chama o adversário pelo apelido carinhoso usado por sua torcida. E nem elogia os jogadores do opositor. Por mais que sejam titulares da seleção, não passam de verdadeiros pernas-de-pau!

E isto passa de pai para filho. Desde os primórdios da infância. Todo moleque de quatro ou cinco anos sabe disso. Um guri gremista jamais usa vermelho nas festinhas do prédio. Um pequeno cruzeirense nunca chama o Atlético de Galo. E por mais que o Neymar arrebente na seleção Sub-20, ele, em tempo algum, será elogiado por qualquer corintianinho, que desde sempre se diz maloqueiro e sofredor.

Ter um rival e cultivar a rivalidade é uma coisa saudável. É o que te faz querer ganhar dele, superá-lo em tudo, ser melhor que ele em todos os detalhes e aspectos possíveis. É o que fez o Coritiba dar uma boa guaribada no Couto Pereira, para que ele ficasse do nível da Arena da Baixada. A rivalidade fez o Fluminense montar um super time para ganhar o Brasileirão um ano depois do Flamengo ter ganhado. E é o que motivou o Bahia a investir tanto a ponto de trocar de lugar com o Vitória nas duas principais divisões do futebol brasileiro.

Mas tem que parar por aí. Rival não é inimigo. Rivalidade é bem diferente de inimizade. Ninguém precisa brigar por causa de futebol. Ninguém precisa agredir, machucar ou matar. Não faz sentido usar violência contra um torcedor de outro time, que pode ser seu colega de trabalho, vizinho ou até mesmo seu primo.

Seu irmão ou sua esposa podem torcer pra outro time. Até seu pai pode. Neste caso, na sua infância vai ter sido outro a te ensinar as regras de como tratar um rival. Assim pode ser melhor ainda do que ter aprendido com seu velho. Porque, tanto na teoria como na prática, vai ser impossível odiar um adversário que só te ensinou e te deu amor.