terça-feira, 12 de julho de 2011

Matilda

Hoje joguei um tênis velho fora. Já estava surrado o coitado. Desbotado, sem costuras, abrindo nas laterais. Coloquei o arremedo do que um dia foi meu objeto de desejo dentro da lixeira e voltei pros meus afazares rotineiros.

Até que me lembrei do dia em que fui jogar fora minha primeira chuteira, e comecei a viajar no tempo. Sinceramente, eu não sei porque ainda guardo essas coisas na memória, mas enfim...

Depois de alguns bons anos usando uma chuteira preta, de couro curtido e travas de ferro, chegou a hora de jogá-la fora. Foram inúmeras partidas, gols, tropeços, quedas, chutes e furadas com a velha companheira. Sob chuva e sol. De manhã, de tarde e à noite. Tinha até nome a primeira chuteira: Matilda!

Minha chuteira era o primeiro artigo a entrar na mochila quando eu viajava. O carinho por ela era imenso. Depois de usada, ela era devidamente limpa, engraxada e guardada na caixa original, dentro de um armário vigiado 24 horas por dia.

Como eu disse, ela era de couro curtido e travas de ferro. Só isso. Nada de tecnologia de ponta, revestimento na sola, material sintético, palmilhas e travas substituíveis. Nada disso! Pensando bem, ela até machucava meu pé, de tão tosca. Mas não tinha problema. Matilda foi a minha primeira chuteira, presente do meu querido avô, e minha companheira nos meus primeiros chutes mundo afora.

Lembro-me bem da hora em que fui jogar a velha amiga na lata de lixo. A substituta já estava lá, como a cantar o réquiem da veterana que jazia. A nova era colorida, moderna, cheia de coisas estranhas e inúteis, mas não conseguia me passar aquela cumplicidade e aquele ar de confiança, que eu tanto tinha com a Matilda.

O fato é que não tive coragem de me desfazer dela. Até hoje Matilda reina soberana num canto de armário da velha casa dos meus pais. Não aceito que me chamem de materialista. Saudosista, talvez sim...

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